Executivos de terminais líquidos falam dos impactos da Covid-19 e criticam consultas públicas que podem comprometer investimentos e segurança

Atividade essencial para a indústria e para a distribuição de mercadorias, o setor de terminais líquidos terá que lidar com a queda na movimentação de combustíveis e de outros graneis líquidos, especialmente os de origem química. As nuances envolvendo essa crise causada pela pandemia de Covid-19 foram abordadas em webinar realizado nesta quinta-feira, 4 de junho, pelo Brasil Export, com mediação de Sergio Aquino, Conselheiro do Brasil Export e presidente da Federação Nacional dos Operadores Portuários (Fenop), e organização do CEO do Fórum, Fabricio Julião.

O presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Terminais Líquidos (ABTL), Aquiles Dias, disse aos participantes da atividade que as empresas associadas à entidade têm capacidade de armazenamento equacionada para atender à atual demanda de movimentação de cargas líquidas no mercado brasileiro e se preparam para fazer futuros investimentos. Para que isso aconteça, entretanto, é preciso melhorar a segurança jurídica e o ambiente de regulação que normatizam o setor. Segundo ele, quase todas as estruturas voltadas para o abastecimento de navios são administradas pela Transpetro, mas neste nicho está uma oportunidade, caso a regulação seja eficiente, para os terminais líquidos criarem suas estruturas e investimentos em tancagem especial para manutenção do combustível a 50 graus, temperatura ideal para dar maior fluidez às operações.

Dias ressaltou que todos os terminais associados à ABTL passam por critérios rigorosos de avaliação e até excedem os controles de segurança exigidos pela legislação vigente em território nacional. “Quase todos os terminais atendem clientes internacionais e é muito comum serem auditados por eles, com critérios mais rígidos do que os brasileiros. Grandes companhias como Basf e Braskem encontram aqui condições satisfatórias e adequadas para movimentação de suas cargas. Jamais colocariam seus ativos a serem movimentados em ambientes que não oferecessem segurança regulamentar”, observou, lamentando a ocorrência de imprevisíveis acidentes, que podem acontecer em qualquer atividade industrial: “Inevitabilidade não há”.

Impactos

Em relação aos impactos da pandemia de Covid-19, o dirigente da ABTL contou que, extraoficialmente, de 10% a 15% da força de trabalho dos terminais foi contaminada até o momento, mas sem registro de óbitos. Segundo dados da Abiquim, citou Dias, em abril a produção da indústria química recuou 19,4% em relação ao mês anterior e, no mesmo período, as vendas internas caíram 35,7%. Os executivos dos terminais que também participaram da videoconferência lamentaram a retração do consumo dos combustíveis e de outras cargas, comunicando que os desdobramentos da crise começaram agora a afetar a normalidade dos terminais.

De acordo com Marcelo Tiacci Schmitt, gerente geral da Stolhaven Terminais Brasil, o frete marítimo se manteve estável desde o início da crise sanitária, mas a tendência é de queda. “Estamos estimando a redução de 10% a 15%, especialmente com a continuidade da guerra comercial entre Estados Unidos e China e a crise de liquidez no mundo. Vários estaleiros tiveram ordens de construção de embarcações suspensas, seja por impacto direto da Covid, seja pela falta de liquidez. Nos preocupa a solvência dos negócios de nossos clientes, especialmente na indústria química. Entendemos que a parte mais difícil para a navegação virá nestes próximos dois quadrimestres”. Ele demonstrou preocupação com a manutenção do cronograma de licitação de terminais pelo Governo Federal tendo em vista a dificuldade, neste momento de instabilidade mundial, de atrair capital doméstico e externo. “O momento é de bastante incerteza em relação a fontes de financiamento para negócios de longo prazo. Nossa matriz em Londres está sendo diariamente bombardeada por notícias que não são favoráveis ao Brasil”.

Helano Pereira Gomes, diretor Comercial de Desenvolvimento e Negócios da Ultracargo, também demonstrou preocupação com o fator regulatório e criticou a revisão da Portaria 251 da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). A consulta pública, temporariamente suspensa devido à disseminação do coronavírus no País, tem como objetivo modificar os critérios para o uso, por terceiros interessados, dos terminais aquaviários existentes ou a serem construídos, regulamentando o direito de acesso. “Se for aprovada vai inibir todos os investimentos. Não estamos em um mercado fechado, cada player do nosso setor tem dezenas de clientes diferentes. Os terminais não são donos de produto, são prestadores de serviço”, explicou. O grupo da Ultracargo é um dos que mais se modernizam no segmento, tendo investido mais de R$ 2 bilhões nos últimos anos em infraestrutura para o recebimento de produtos e atendimento aos clientes.

Embora o percentual de queda na movimentação de diesel e de gasolina já supere os dois dígitos, as operações da Cattalini Terminais ainda não foram totalmente afetadas, disse o diretor-presidente da empresa, José Paulo Fernandes. “Como trabalhamos com importação e o ciclo que envolve planejamento, compra e transporte é longo, vamos começar agora a sentir os impactos”. Ele explicitou preocupação com outra consulta pública aberta no Brasil, proposta pela Subsecretaria-Geral da Receita Federal do Brasil, que poderia permitir a descarga direta e o despacho aduaneiro de importação de mercadoria transportada a granel. Caso seja aprovada, modificaria a Instrução Normativa RFB 1282, de 16 de julho de 2012, permitindo a descarga de graneis líquidos e sólidos diretamente do cais para veículos como caminhões ou para recintos não alfandegados. “O que nos preocupa é a questão da segurança, afinal a operação é crítica e ameaça o meio ambiente e a saúde dos envolvidos e alguns desses produtos são inflamáveis e corrosivos”.

(Texto: Bruno Merlin)
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